Direitos do consumidor na desistência da compra do lote
A questão da quebra do contrato de compra e venda, ou distrato imobiliário, é algo comum no mercado imobiliário e sempre gerou inúmeras discussões no judiciário brasileiro, especialmente em que percentual seria justo para a devolução ao comprador do que havia pago.
Com a persistente crise econômica dos últimos anos e as alterações legislativas no ano de 2008 e mais recentemente pela pandemia do coronavírus levou ao setor imobiliário a ter um crescimento nos pedidos de distratos imobiliários e novos questionamentos de qual seria o direito das partes referente a desistência.
COMO SOLICITAR O DISTRATO DA COMPRA E VENDA?
O comprador que está pagando as parcelas do lote e por algum motivo pretende desistir da compra, antes de mais nada deve analisar o contrato de compra e venda e para entender o que ficou definido em contato em caso de rescisão.
Verificado as cláusulas do contrato é o momento de entrar em contato com a imobiliária, incorporadora ou loteadora e solicitar formalmente o distrato imobiliário, também chamada popularmente de quebra do contrato.
A empresa ao receber o pedido de distrato imobiliário, deve fazer os cálculos rescisórios aplicando a multa do contrato e devolver em uma única parcela a parte do consumidor.
COMO É NA REALIDADE O DISTRATO IMOBILIÁRIO?
O caso que vou relatar aqui é uma situação corriqueira para quem deseja o distrato imobiliário.
Recentemente recebi no escritório para uma consulta sobre distrato imobiliário, um cliente chamado Agnaldo (nome fictício), que me relatou que antes pagava uma parcela de R$ 411,00 (quatrocentos e onze), reais pelo lote, e agora estava pagando o valor de R$ 725,80.
Analisando sua situação financeira, Agnaldo, viu que a parcela impactava seu orçamento doméstico e não iria mais conseguir pagar as parcelas do lote, relatando ainda que procurou a loteadora, pedindo que reduzisse o valor das parcelas, sendo que esta deu apenas 2 (duas) opções:
Renegociação do contrato: A proposta ofertada para o senhor Agnaldo, foi de aumentar o número de parcelas do contrato com a repactuação de juros e correção para subsidiar a diminuição do valor da parcelas. O problema é que a dívida ficaria muito maior no final.
Distrato imobiliário: A outra opção seria o distrato imobiliário com a retenção de 25% do valor total pago a título de despesas administrativas, mais um percentual de 0,75% a título de taxa de fruição, e a comissão de corretagem. O valor restante após os descontos, seriam devolvidos ao senhor Agnaldo de forma parcelada.
É claro que o senhor Agnaldo não aceitou nenhuma das propostas apresentadas pela loteadora, pois eram abusivas.
O QUE DIZ A JUSTIÇA SOBRE A DESISTÊNCIA DA COMPRA?
O entendimento do Superior Tribunal de Justiça é de que nos contratos submetidos ao Código de Defesa do Consumidor, é obrigatório nos casos de rescisão do contrato a imediata restituição das parcelas pagas pelo comprador, integralmente, e no caso de culpa exclusiva, o valor parcialmente.
Veja o que diz a Sumula 543, do STJ:
“Súmula nº 543 do STJ - Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador – integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento”.
Da leitura do dispositivo podemos perceber que a loteadora errou ao negar a devolução para o senhor Agnaldo.
Veja que no caso apresentado nosso cliente deu causa a resolução do contrato pois não conseguia mais pagar as parcelas, mas da leitura da súmula está claro que ele tem direito a devolução imediata dos valores pagos, abatido eventual percentual de multa.
Na consulta com o senhor Agnaldo, tranquilizei-o demonstrando que a loteadora estava equivocada e que ele tinha sim o direito a devolução imediata dos valores pagos, abatido a multa contratual, obviamente.
MAS QUANTO TENHO DIREITO A RECEBER SE FIZER A RESCISÃO DO CONTRATO DE COMPRA E VENDA?
Outro ponto que estava deixando o senhor Agnaldo aflito era o fato de a loteadora ter informado que ele teria direito a apenas a restituição de uma pequena quantia do que havia pago, e seria devolvido de forma parcelada.
Mais uma vez tratei de tranquiliza-lo, mostrando que o entendimento do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que em caso de rescisão de contrato, mesmo que por culpa do comprador é seu direito a restituição do percentual que varia de entre 75% até 90% do que foi pago.
Mostrei essa jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
"CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL CUMULADA COM DEVOLUÇÃO DE QUANTIAS PAGAS. DESISTÊNCIA PELO COMPRADOR. PERCENTUAL. RETENÇÃO. POSSIBILIDADE. SÚMULA 568/STJ. MONTANTE FIXADO PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. REVISÃO. SÚMULA 7/STJ. 1. Ação de rescisão contratual c/c devolução de quantias pagas. 2. A atual jurisprudência do STJ define que, em caso de rescisão de compromisso de compra e venda por culpa do promitente comprador, é possível ao vendedor reter entre 10% e 25% dos valores pagos. 3. A análise da razoabilidade do percentual fixado pelo Tribunal de origem observando os parâmetros estabelecidos pelo STJ, encontra óbice na Súmula 7/STJ. 4. Agravo interno não provido. (AgInt no REsp 1822638/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 18/11/2019, DJe 20/11/2019)."
Então ao final da consulta, o senhor Agnaldo estava tranquilo, visto que sabia que no caso de rescisão do contrato de compra e venda, a justiça lhe daria o direito à restituição imediata dos valores pagos que havia pago após o abatimento da multa contratual que poderia variar entre 10% a 25%.
NA RESCISÃO DO CONTRATO ESTÃO COBRANDO TAXA DE FRUIÇÃO ESTÁ CORRETO?
Sobre este tema, primeiro analisei que o Senhor Agnaldo não havia construído no lote e apenas pagava as parcelas todos os meses.
Assim, pude lhe explicar que a taxa de fruição possui como fato gerador a posse, uso e gozo exercidos sobre o bem.
Tratando o contrato rescindendo de compra e venda de lote de terras sem construção do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás tem o seguinte posicionamento:
“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REIVINDICATÓRIA C/C REPARAÇÃO DE DANOS. TAXA DE FRUIÇÃO PELA OCUPAÇÃO INDEVIDA DE IMÓVEL. AUSÊNCIA DE EDIFICAÇÃO NO LOTE QUE JUSTIFIQUE A FIXAÇÃO DE TAL VERBA. INDENIZAÇÃO DAS BENFEITORIAS/ACESSÕES. POSSIBILIDADE. POSSUIDORA DE BOA-FÉ. RESPONSABILIZAÇÃO DA RÉ PELOS TRIBUTOS E ENCARGOS REFERENTES AO IMÓVEL DURANTE O PERÍODO DE OCUPAÇÃO. PEDIDO EXORDIAL NÃO ANALISADO NA SENTENÇA. VÍCIO CITRA PETITA. APLICAÇÃO DO ART. 1.013, § 3º, III, DO CPC. JULGAMENTO PELO TRIBUNAL. OMISSÃO DO JULGADO TAMBÉM NO TOCANTE AO PEDIDO RELATIVO AOS LOTES 07 E 08. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. SUPRESSÃO DE OFÍCIO. I- A verba de fruição, também conhecida como taxa de ocupação, representa uma indenização ao proprietário pela posse indevida do seu imóvel, com o objetivo de compensá-lo pela renda que deixou de auferir, em atenção ao princípio da vedação ao locupletamento ilícito. II- Tratando-se de lote vago sem qualquer edificação, não há falar em proveito econômico proporcionado pelo imóvel e auferido pela ré, capaz de ensejar a recomposição a título de sua fruição. (...) RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA DE OFÍCIO”. (TJGO, APELAÇÃO 0178010-51.2016.8.09.0011, Rel. LUIZ EDUARDO DE SOUSA, 1ª Câmara Cível, julgado em 13/06/2019, DJe de 13/06/2019)"
Assim demonstrei que a jurisprudência tem afastado a aplicação da taxa de fruição considerando que no caso concreto inexiste provas acerca de construção no lote, bem como a ausência de demonstração do proveito econômico efetivo obtido pelo devedor após ter se tornado inadimplente ou pedir o distrato.
COMO FICA A RESCISÃO DO CONTRATO DE COMPRA E VENDA APÓS A LEI 13.786/2018?
Pontua-se que no caso do nosso cliente Agnaldo, essa lei não é aplicável pois o contrato de compra e venda dele, foi assinado antes da vigência da Lei 13.786/18.
A lei nº 13.786 de 27 é de dezembro de 2018 e trouxe diversas modificações nas principais leis que tratavam dos contratos imobiliários (leis nº 4.591/64 e 6.766 /79).
A nova lei estipula a pena convencional (multa contratual) de 25% da quantia paga quando a resolução do contrato se der por desistência ou culpa do adquirente.
Este percentual pode chegar ao elevado percentual de 50% de multa, sobre o valor pago, quando a incorporação estiver submetida ao regime do patrimônio de afetação, após a dedução da corretagem, a fim de assegurar o término da obra no caso de falência da construtora.
Ou seja, conforme a referida lei quem pretende desistir da compra e venda em caso de incorporação submetida ao regime de patrimônio de afetação poderá ter retido 50% do que foi pago.
CONCLUSÃO
O presente texto apresenta apenas uma pequena parte sobre o direito do consumidor ao fazer a rescisão do contrato de compra e venda.
Sobre o caso que contamos, a boa noticia é que nosso cliente teve êxito em sua demanda e não ficou no prejuízo, recebendo uma parte justa do que havia pago.
Caso você esteja passando por uma situação parecida, recomendo que você fale com advogados especialistas para atua em seu favor!
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